CINCO POEMAS DO EGO DO FOGO
I
ALEGORIA
Despe
Se
E
Despede-se
Já (re)feita
Acolheita do gemido
A brisa envolve-a
Aos olhos hospeda o sol
Com o alívio e saturação
Traz nos pés
Tecidos de hino
O enobrecimento
Beleza da zebra
E a alegoria que faz
Enfatiza a vaidade
De todo este herero
Canto feminino
Recanto kuvale
II
HINO DOS ADIVINHOS
Roça-me o rosto de uma criança
Com o brilho de salitre
O sol cede-me o mar
Encena-me a sociologia de Angola
Sobre o questionamento do destino
Que aponta-me para a penumbra
Fome
Corrupção
Nudez
Prostituição
Embriaguez
Males e medos de morrer antes de viver
Um assobio agudo
Alivia o desespero do combatente
Ex-herói atirado ao trabalho da mente
E mãos vazias… o alcoolismo
Sorri-me a igreja restaurando
A urgência do dizer
De tarde vem o sol
A indicar-me o novo destino
E a manhã será outra morte
III
GESTO DUPLO
A mulher bonita
É como o texto do dia
Serve-se do sol supremo
Quando a inundação do mastro
Alcança-lhe o orgulho do agora
Encena-se de feições
Quando a caça escasseia o cervo
Seduz-se de tesouro
Quando o leito da margem
Minimiza a abundância dos passos
A mulher bonita
É como o gesto da esteira
Serve-nos de cortesia
Quando a noite adensa-lhe
Primordialmente um gesto
Estende-nos a palavra passe
Quando a noção do inverno
Inventa a sonegação do olhar
A mulher bonita
É como o suavizar do tempo
Pousa-nos o olhar
Quando a trepidação da festa
Conquista-lhe o retorno
IV
FINEZA DO PASSO
No pasto do gado a fêmea
Semeia o corpo sublime da renovação
Devolve o sol ao percurso do dia
E acelera o regresso dos enfeites
No alto soletrar do mwene eumbo
Para a percussão das palavras
Nada a onda larga senão a onde anda
O passo que passa fino e fiel
A nuvem do trovão
Celebra o branco das avenidas
Com arrogância da lança
Sede-lhe a meditação do atlântico
E passa a mão ao rosto do céu
Com o grito
Rouco da sonolência Kwanyama
Com o punho da abóbora
Atravessa a perturbação da virtude
E realiza a plenitude do regresso
V
SERPENTE(N)CANTADA
Ao pôr-do-sol
Descem de regresso e vão ao encontro
Do gesto vago
Da minha instância
Deitados
Detêm
O tecto e o resguardo das sandálias
Que trago sob a pronúncia
Do dizer tradicional
Vestido de oralidade serpentina
No sobe e desce da vida
Ávida a tua voz
Esquece-se de ti e vem vestir-se de mim
Sob a imitação
Dos sonhos e adágios do silêncio
Quando a dança da confirmação
Convoca-nos as cordas vocais
Teus olhos de serpente(n)cantada
Parem luz de poesia suspensa
E vêem queimar-me em combustão
Na onda e hora do querer